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sexta-feira, janeiro 09, 2004

 

Algumas notas íntimas de D. Manuel II sobre o Regicídio, no Terreiro do Paço, no dia 1 de Fevereiro de 1908


"Vou agora contar o que se passou naquela histórica Praça.
/…/
Eu estava olhando para o lado da estátua de D. José e vi um homem de barba preta, com um grande gabão. Vi esse homem abrir a capa e tirar a carabina. Eu estava tão longe de pensar num horror destes que me disse para mim mesmo, sabendo o estado de exaltação em que isto tudo estava "que má brincadeira". O homem saiu do passeio e veio se pôr atrás da carruagem e começou a fazer fogo.
Faço aqui um pequeno desenho para mesmo me ajudar:


1)
Estátua de D. José


2)
sítio onde estava o Buíça, o homem de barbas


3)
lugar onde começou a fazer fogo


4)
sítio aproximadamente onde devia estar a carruagem real quando o homem começou
a fazer fogo


5)
portão do Arsenal


6)
Praça do Pelourinho


7)
sítio aproximadamente donde saiu o tal Costa que matou meu Pai

Quando vi tal homem de barbas, que tinha uma cara de meter medo, apontar sobre a carruagem percebi bem, infelizmente, o que era. Meu Deus que horror. O que então se passou. Só Deus minha Mãe e eu sabemos; porque mesmo o meu querido e chorado Irmão presenceou poucos segundos porque instantes depois também era varado pelas balas. Que saudades meu Deus! Dai-me a força Senhor para levar esta Cruz, bem pesada, ao Calvário! Só vós, Meu Deus sabeis o que tenho sofrido!
Logo depois do Buíça ter feito fogo (que eu não sei se acertou) começou uma perfeita fuzilada, como numa batida às feras! Aquele Terreiro do Paço estava deserto nenhuma providência! Isso é que me custa mais a perdoar ao João Franco. /…/
Sei de um dos comandantes da polícia o Coronel Correia estava muito inquieto e o João Franco não acreditava que pudesse ter lugar qualquer coisa desagradável, quanto menos um horror destes, e infelizmente não estavam tomadas providências nenhumas.
Imediatamente depois do Buíça começar a fazer fogo saiu de debaixo da Arcada do Ministério um outro homem que desfechou uns poucos de tiros à queima-roupa sobre o meu Pai; uma das balas entrou pelas costas e outra pela nuca, que O matou instantaneamente. Que infames! para completarem a sua atroz malvadez e sua medonha covardia fizeram fogo pelas costas. Depois disto não me lembro quase do resto: foi tão rápido! Lembra-me perfeitamente de ver a minha adorada e heróica Mãe de pé na carruagem com um ramo de flores na mão gritando àqueles malvados animais, porque aqueles não são gente "infames, infames".
A confusão era enorme. Lembra-me também e isso nunca poderei esquecer, quando na esquina do Terreiro do Paço para a Rua do Arsenal, vi o meu Irmão em pé dentro da carruagem com uma pistola na mão. Só digo d'Ele o que o Cónego Aires Pacheco disse nas exéquias nos Jerónimos: "Morreu como um herói ao lado do seu Rei"! Não há para mim frase mais bela e que exprima melhor todo o sentimento que possa ter./…/
Quando de repente já na Rua do Arsenal olhei para o meu queridíssimo Irmão vi-O caído para o lado direito com uma ferida enorme na face esquerda de onde o sangue jorrava como de uma fonte! Tirei um lenço da algibeira para ver se lhe estancava o sangue: mas que podia eu fazer? O lenço ficou logo como uma esponja:
No meio daquela enorme confusão estava-se em dúvida para onde devia ir a carruagem: pensou-se no hospital da Estrela, mas achou-se melhor o Arsenal.
Eu também, já na Rua do Arsenal fui ferido num braço por uma bala. Faz o efeito de uma pancada e um pouco uma chicotada: foi na parte superior do braço direito.
Agora que penso ainda neste pavoroso dia e no medonho atentado parece-me e tenho quase a certeza (não quero afirmar porque nestes momentos angustiosos perde-se a noção das coisas) que eu escapei por ter feito um movimento instintivo para o lado esquerdo."

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